quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Carta

Meu Amor,

   Tenho os meus sonetos guardados para ti, mas hoje não me apeteceu transcrever nenhum deles do caderno de apontamentos. Preguiça não é, falta de criatividade tão-pouco. Felizmente, imaginação é algo que nunca me faltou, e sei que poderei contar sempre com ela.
   A Poesia, para mim, é algo simplesmente de ulterior e supremo. Creio que é o melhor género literário a partir do qual consigo expressar de uma forma tão mais bela o que o meu coração não é capaz de manter calado.
   Esta noite, esperando voltar a ver-te, não só em sonhos, mas diante de mim, a uma carícia de distância, enquanto me perco nas tuas íris de avelã, sinto que devo bradar aos céus. Bem sei que é de uma loucura a roçar o cliché cinematográfico querer voar até à Lua e voltar quase como que instantaneamente. Mas é como se o seu brilho lunar, de pérola, como não há muito assim falei sobre ela, me chamasse das suas obscuras profundezas, como estando perdida no mar, resguardada pela concha de uma ostra, à espera de ser encontrada. Como se o canto da sereia ecoasse a um ritmo cada vez mais compassado e audível, à medida que a ondulação mergulha de cabeça sobre os grãos de areia túmidos de sal, querendo libertar-se da prisão solitária do oceano, embora não conseguindo à primeira tentativa. Tem por isso de recuperar a força arrastando os seus aquáticos membros pelo agora mais suavizado areal, de regresso ao seu todo, ao seu inteiro corpo, para poder atirar-se em rebentamento e oferecer uma parte de si à praia que procura beijar desde a eternidade.
   Eu sinto-me preso, também. Não pensei no devido valor desta analogia, mas não quero, de qualquer forma, complicar este «problema de expressão» com palavras apetrechadas de asas. Deixá-lo-ei para quando escrever outro épico, se tal tiver de acontecer.
   Quero alcançar o teu rosto, tornear o teu corpo num abraço e guardar-te apenas e só para mim. A minha rotina continua, assim como prossegue no bom sentido, pois que adormeço contigo no pensamento, sonho contigo na minha imaginação, cuja chama viva é ateada pela força do meu compassado instrumento de corda, desrespeitando o metrónomo quando a mente lhe diz que o beijo de amor está prestes a consumar-se, apenas para ser interrompido pelo despertar, aguardando o final daquela cena téspia, embora não encenada, mas tão real quanto conseguirmos torná-la.
   Nada nos impede, é o desejo de dois corações desenhados pela Natureza para se associarem um ao outro em perfeita harmonia.

   Amo-te.
   Sonha com o arco-íris.

Ti

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