domingo, 26 de outubro de 2008

Vida

Há certas alturas em que penso na vida. Pensar, simplesmente. E surpreendo-me imenso com as coisas que nela aparecem, desaparecem, piscam, etc.
Há momentos em que sou apanhado pelo reverbar de coisas que já foram e das quais se tem saudades, das quais sentimos muita falta, porque passaram a fazer parte de nós e agora já não fazem.
Confesso que olhando para trás, há muita coisa boa que ganhei, e muita coisa boa que perdi. Não quero estar a referir-me a nada em concreto. E muita coisa boa que perdi deu-se à conta daquilo que ganhei e que não me arrependo de ter ganho.
Há recordações que guardo no obscuro da minha memória, para que não tenha de passar por elas quando procuro outras coisas. Mas hoje, num rápido e instintivo desejo, quis reabrir o baú. Não me vieram lágrimas aos olhos, daquilo que vi. Sempre ouvi dizer que chorar sobre leite derramado não vale o esforço envolvido.
Por muito que se diga que não nos resta alternativa senão seguir em frente e deixar para trás o que ficou para trás, o nosso coração acaba sempre por nunca ligar os pedaços todos, especialmente se a quebra for grande, bruta e intensiva.
Resumindo... tenho saudades de viver. Não que esteja morto, mas tenho saudades da vida que houve em certa altura.
Fico feliz por saber que nesta chamada vida há várias e diferentes fases pelas quais temos de atravessar. É isso que nos prepara para o resto dela... da vida. Contudo, há fases nas quais gostaria de entrar e não sair mais, porque sei que aí eu era feliz.
Tenho saudades das palavras, do tacto, das acções, dos sons, dos aromas, do sentimento.
Do momento.
O momento olímpico. Não há nem mar nem terra. Só céu. Tenho vontade de me mandar, de me esbarrar contra as portas do paraíso, seja ele qual for, tenha o que ele tiver, e entrar, mas vivendo. Vivendo o que vivi.
A vida tem destas coisas. Tanto pode ser substancialmente agradável como mortalmente mórbida. Mas não estou neste estado. Posso já ter estado, mas agora não estou.
Há alturas na vida em que temos certezas. Mas as certezas, supostamente, deviam ser definitivas e intemporais, sobrevivendo a toda a humanidade. É nestas alturas da vida que afinal podemos estar seguros de que não há certeza alguma. Vivamos o presente, dirão uns. Por muito esotérico que eu queira ser, tenho de admitir que também tenho um passado. Do qual tenho saudades. E muitas. Mas o que tem piada é que eu, simultaneamente, não quero que esse passado regresse. Pelo menos, não sob a forma como se passou. Se então só existe um presente, que a vida recomece constantemente mas, gaita!, por uma vez na vida que seja com as opções que pretendemos! Um bom sítio por onde podemos começar: esquecendo o passado. Ah, cometi tantos erros no passado... Erros que guardo com rancor.
Pudera eu não ter cometido tantos erros assim, perdendo-me a mim e ao contexto entre os outros do passado então presente.
Tenho saudades, apenas. Do que fui, enquanto fazendo coisas boas. Do que vivi, enquanto foram bons momentos. Tenho saudades do que se perdeu.
Por sorte, mas só por sorte, a vida tem compaixão por nós. E dá-nos segundas oportunidades. São sempre segundas. E a vida vai dando e dando... Como num jogo de cartas: o baralho nunca mais acaba. Só o imbecil fica com o joker. O merecedor (que se julga ser merecedor mas que até pode nem ser) ganha o dois de paus.
Mas loucura! Comparar esse dom tão belo e precioso da VIDA a um simples jogo de sorte! Joguemos à roleta russa, então! CLICK! Foi sorte, foi sorte! Tristeza...
Às tantas já nem sei de que me queixo. Da vida? Talvez. Certo é que... no fundo, a vida gosta de mim. Descobri isso há pouco tempo. Deu-me uma Nova Oportunidade, como os outros dão aos outros que não tiveram vida fácil. Este socorro que a vida me deu... hmm... Serão planos para mim? Serão bons planos? Uma nova vaga se avizinha nas minhas praias cobertas de lascivos restos carnais? Talvez.
Se não queremos ser demasiado exigentes, então...
Dai-nos o pão nosso de cada dia, Senhor.